Rock In Rio: Titica, a cantora trans entre crianças na Angola

Teca Miguel Garcia ou Titica se tornou um ícone pop em Angola, desafiando o conservadorismo de seu país com a ajuda das crianças. A cantora é uma das atrações do palco Sunset no segundo fim de semana do Rock in Rio.

Titica e o vocalista da Baiana System, Russo Passapusso (Foto: Reprodução/Instagram/Titica)

Pra quem não sabe, Titica é a rainha do Kuduro e citada como referência por Björk. Em entrevista ao portal G1, Titica conta ter sido a primeira artista de Angola a assumir sua transexualidade, aos 17 anos. “Tive medo. Não foi fácil e não é até hoje. Tem certos lugares em que não canto”, diz.

Seu carisma e a popularização do gênero, antes marginalizado, também foram determinantes para vencer o preconceito. “Hoje, quando falam em dez boas artistas angolanas, meu nome está lá no meio e fico feliz por isso.”

O kuduro nasceu nos guetos de Luanda e, por muito tempo, foi associado ao crime, segundo a cantora. A sonoridade tem referências de rap, funk, house e eletrônica. As letras, geralmente cantadas em português, podem falar de amor, sensualidade, sofrência ou protesto.

As coreografias também são importantes. Titica já emplacou, entre outras, “Chão chão”, “Olha o boneco”, “Procura o brinco” e “Estou na parede”.

No Rock in Rio, esse ritmo vai se juntar nesta sexta (22) às batidas da Baiana System, banda que é queridinha da nova música de Salvador. O grupo e a cantora – que foi bailarina e já dançou no carnaval da Bahia – gravaram juntos “Capim Guiné”. A faixa, que também tem a participação de Margareth Menezes, será apresentada ao vivo no palco Sunset.

Na entrevista abaixo, Titica fala sobre os elementos que aproximam Bahia e Angola, a história do kuduro e a falta de intercâmbio cultural entre o Brasil e seu país. Também conta como é ser uma artista trans em uma nação que rejeita homossexuais.

G1 – O que aproxima o seu som e o da Baiana System?

Titica – A parte eletrônica. As músicas deles são mais eletrônicas, tem mistura de rock, e isso tem muito a ver com o kuduro. As duas coisas casam.

G1 – Você gravou com a banda a música “Capim Guiné”, que foi feita pelo Russo Passapusso [vocalista da Baiana System]. Como deu sua cara à faixa?

Titica – A música já estava pronta quando ele mandou. Vou confessar que não é bem a minha praia cantar músicas com letras assim, mais engajadas. Sou de músicas mais safadas, na linguagem certa. Mas foi bom. Gostei da batida, é uma nova experiência.

G1 – Como será o clima desse encontro no palco?

Titica – A química entre nós foi boa, graças a Deus. O mais importante é a boa química. No palco, vamos deixar fluir. Sei que vai ter boa coisa. Vai ter muito kuduro, até o chão. Não sou muito de falar, gosto mais de fazer.

G1 – Você é sempre citada como a primeira artista assumidamente transexual do seu país. Isso é verdade? Como foi se assumir?

Titica – É verdade sim. No início não foi fácil, tem preconceito e tudo isso.
“Eu sempre lutei para me impor, para impor respeito. Sempre vivi minha vida. E, graças a Deus, sou uma artista carismática. A maioria dos meus fãs é formada por menores de idade e pessoas mais velhas.” Tenho essa proteção das crianças. Consegui entrar na casa das pessoas através das crianças. Elas são meus anjos.

G1 – Você já teve medo que o preconceito prejudicasse a sua carreira?

Titica – Tive. Não foi fácil e não é até hoje. Tem certos lugares em que eu não canto. Mas, hoje, quando falam em dez boas artistas angolanas, meu nome está lá no meio e fico muito feliz por isso. Tive de lutar, me impor, não fazer frente à ninguém, fazer bem meu trabalho. Sempre tive foco e hoje sou respeitada.

G1 – Acha que a intolerância tem diminuído?

Titica – Tem diminuído muito. Há lugares em que eu não cantava e hoje em dia já canto. Há pessoas que não me aceitavam. As pessoas associavam minha sexualidade à minha música. Passaram a separar, a conhecer. Muita gente julgava sem conhecer. O respeito agora é outro.

G1 – O Brasil e a Angola falam a mesma língua, mas o intercâmbio cultural entre os dois países é pouco. Na sua opinião, por que isso acontece?

Titica – Tinha mesmo que haver mais intercâmbio cultural. O povo brasileiro é muito por ele mesmo, dá mais valor às suas coisas. E tem que ser assim. Mas temos que fazer mais intercâmbio, assim aprendemos mais com o povo brasileiro e eles aprendem conosco.

Mesmo assim, há muitos brasileiros que tem ido a Angola para dividir o palco com a gente. Alcione, Roberta Miranda… Também já foram Roberto Carlos, Alexandre Pires e Belo, que é muito querido por lá.

G1 – O kuduro é o pop da Angola?

Titica – É sim, é um gênero muito, muito ouvido. A princípio, foi muito criticado. Poucas mulheres faziam kuduro e os rapazes que faziam eram considerados marginais.
“Os que estavam na vida do crime viam o kuduro como uma forma de libertação. Eles ficavam famosos e abandonavam a má vida porque conseguiam ter o pão de cada dia. ”

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